Um dos mais aguerridos nomes da esquerda no mundo da cultura, Paulo Betti diz que assinou a “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado democrático de direito” assim que topou com o documento, compartilhado entre o grupo de artistas do qual faz parte.
“Foi logo de cara, foi imediatamente”, afirma. “Acho oportuno, porque vai coincidir com as manifestações de rua.”
O ator, historicamente ligado ao PT, diz que tem simpatia pela “grande costura” que representa o manifesto, iniciativa que partiu de um grupo de ex-alunos da Faculdade de Direito da USP e que reúne um amplo espectro de ideologias. “Gosto dessa possibilidade de um grande consenso, dessa perspectiva de todo mundo estar atento para defender a nossa democracia.”
Atenção que, no caso de Betti, se dirige a um aspecto que ele diz ser pouco mencionado por aí, “para além dessas falas absurdas” do presidente Jair Bolsonaro e do armamento da população, “que acontece sem qualquer controle”.
“Não estão dando a devida proporção a essas motociatas, que, para mim, são uma preparação para um golpe. Em questão de minutos, com poucos disparos de WhatsApp, esses malucos conseguem ser articulados no Brasil inteiro. E se cada um carregar outro maluco armado na garupa, imagina a confusão. Havendo um caos, isso pode ser pretexto para eles defenderem a intervenção militar.”
Paulo Betti não costuma ser alheio a discutir política. “O [ator e diretor] Antônio Abujamra costumava dizer para nunca duvidarem da capacidade de união dos artistas. E não é só porque estamos sendo atacados por uma perseguição ideológica, é por termos mesmo um pensamento consensual de que arte, de que cultura são importantes. É tradicional da nossa categoria se manifestar.”
O que não significa que todas as suas manifestações, em particular, tenham sido bem digeridas. Como em 2006, quando o ex-presidente Lula disputava a reeleição em meio a denúncias de corrupção afloradas pelo escândalo do mensalão. Naquele ano, o ator defendeu o Partido dos Trabalhadores e disse que não era possível fazer política “sem pôr a mão na merda”.
“Aquilo foi um deslize verbal e foi descontextualizado. Foi um mal-entendido”, diz hoje, 16 anos depois. “Eu estava me referindo à obra ‘As Mãos Sujas’, de Sartre”, completa, citando a peça teatral que debate o dilema entre a utopia e o pragmatismo político. Ou, em outras palavras, “entre a morte pela fome e o pedágio”. “Se o preço para se tirar o Brasil da miséria era pagar uma mesada, eu conseguia deglutir a ideia da mesada.”
Betti recebeu uma torrente de críticas, mas diz que houve quem o compreendesse. O escritor Raduan Nassar e a intelectual feminista Rose Marie Muraro, afirma, foram alguns deles e elogiaram o texto que ele publicou nesta Folha comentando a própria fala. “Talvez se eu fosse mais neutro, eu teria chances de fazer mais publis”, brinca hoje. “Mas não tem jeito.”
É justamente por esse pragmatismo que o ator afirma que “é ótimo” que Lula conte com Geraldo Alckmin como candidato a vice em sua chapa –naquele mesmo 2006, vale dizer, o ex-governador paulista foi o grande opositor do petista no pleito e martelou o escândalo do mensalão na campanha.
“Não podemos dar moleza. Não sou filiado ao PT, mas fui um dos primeiros a dizer que era ótimo contar com o Alckmin, que é um cara civilizado, tranquilo, bom de conversa. Achei uma sacada de mestre do Lula, mostra um conhecimento profundo que ele tem de política.”
Política que, por sinal, não dá descanso. O ator agora se prepara para o lançamento do próximo filme que protagoniza, “O Debate”, estreia na direção do ator Caio Blat a partir de um roteiro de Guel Arraes e Jorge Furtado, marcado para chegar aos cinemas no próximo dia 25.
No enredo, Paulo Betti e Débora Bloch vivem um ex-casal de jornalistas que precisam juntos editar o debate televisivo entre dois candidatos a presidente em 2022.
Ainda não está claro se a trama menciona os nomes de Lula e Bolsonaro, e o ator tampouco desfaz o mistério. “Melhor falarmos sobre o filme futuramente.”
Fonte: Folha de São Paulo
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