A coluna de tanques blindados do tipo Bradley avançou lentamente, cheia de soldados ucranianos para avançar contra tropas da Rússia. A ofensiva da Ucrânia levava consigo uma arma americana nova e potente para a frente da guerra.
Mas um desses blindados passou sobre uma mina explosiva. O baque detonou um dos trilhos do tanque, imobilizando-o. Após o incidente, a coluna ucraniana inteira mudou de direção e recuou no campo de batalha.
Três semanas depois de lançada uma contraofensiva, considerada crucial para as perspectivas da Ucrânia contra a Rússia, o exército de Volodimir Zelenski vem topando com uma série de desafios que complicam seus planos —apesar de ele estar usando armas sofisticadas fornecidas pelo Ocidente.
Um desses problemas é uma área vasta de campos minados que protege a linha defensiva russa, formando uma zona letal para tropas ucranianas que avançam pelas estepes abertas do sul. “Tudo está semeado de minas, em toda parte”, disse o tenente Ashot Arutiunian, comandante de uma unidade de drones.
No final de semana, um motim de forças mercenárias em solo russo gerou esperanças na Ucrânia de que o avanço de seu exército pudesse ser um pouco facilitado. No entanto, a rebelião realizada pelo grupo Wagner durou pouco.
Mas os ucranianos ainda enfrentam obstáculos que diferenciam esta campanha de sua rápida investida pela região de Kharkiv, em setembro, e até mesmo da ofensiva mais árdua que recapturou Kherson em novembro.
O terreno no sudeste da Rússia é formado principalmente por campos planos e abertos, contrastando com as colinas ondulantes do Donbass ou do norte do país, coberto de floresta. Isso priva as tropas ucranianas de cobertura. Por sua vez, os russos estão há meses abrigados em linhas extensas de trincheiras, o que dificulta o esforço de removê-los.
Além disso, helicópteros de ataque russos KA-52 vem conseguindo esquivar-se da defesa antiaérea, o que também atrasa os movimentos ucranianos. Ao mesmo tempo, o poderio de Vladimir Putin vem danificando ou destruindo armamentos fornecidos pelo Ocidente.
Segundo um oficial militar americano sênior, as tropas russas têm se mostrado hábeis em semear minas novamente em alguns campos que já haviam sido limpos com a ajuda de equipamentos fornecidos pelo Ocidente.
De acordo com o mesmo oficial, forças ucranianas da linha de frente estão fazendo uma pausa para reavaliar quais táticas e técnicas de remoção de minas funcionam melhor.
A resistência tem efeitos negativos sobre os armamentos da Ucrânia. Os Estados Unidos prometeram 113 veículos de combate Bradley em março. Pelo menos 17 deles –mais de 15%— já foram danificados ou destruídos nos combates até agora.
Esses obstáculos converteram as etapas iniciais da contraofensiva em um esforço estafante, lento e sangrento, no qual as forças ucranianas só conquistaram 6,5 km de território em seu maior avanço até agora. É menos da metade da distância que a Ucrânia precisa atravessar –ameaçada por minas terrestres e bombardeios implacáveis da artilharia russa— para alcançar as principais posições defensivas russas.
“Eles cavaram trincheiras, semearam minas no território, estão preparados”, disse Yevhen, soldado raso de uma unidade paramilitar. Como alguns outros, fez questão de ser identificado apenas por seu primeiro nome e sua patente. “É difícil, mas não há outra opção.”
Apesar do progresso lento da contraofensiva, autoridades ucranianas dizem que as principais batalhas para entrar nas defesas russas estão por vir. Como a maior parte da força ucraniana ainda está sendo mantida na reserva, é cedo para avaliar o sucesso ou fracasso.
O presidente ucraniano admite o progresso lento, mas também alerta contra o que chamou de expectativas irrealistas de uma blitzkrieg (guerra-relâmpago, em alemão) cinematográfica.
“Algumas pessoas pensam que isto é um filme de Hollywood e esperam resultados já”, disse Zelenski em entrevista à BBC na semana passada. “O que está em jogo são as vidas de pessoas. Vamos avançar no campo de batalha da maneira que julgarmos ser melhor.”
Em Washington, funcionários da administração Biden agora estão recomendando paciência, apesar de manifestarem apreensão com o fato de o progresso inicial ter sido lento. Um alto funcionário descreveu como preocupantes os resultados das duas primeiras semanas. “Eles estão atrasados em relação ao previsto”, disse.
Já um oficial militar americano sênior também reconheceu que o ritmo das operações está mais lento do que o esperado. Ele acrescentou, no entanto, que isso não é imprevisto, dadas as extensas defesas russas, e avisou que não se devem tirar conclusões amplas com base nas operações iniciais.
Os dois funcionários exigiram anonimato para discutir avaliações governamentais confidenciais.
A Ucrânia quer dividir o território ocupado pela Rússia no sul em duas zonas. O objetivo é cortar as linhas de abastecimento da península da Crimeia e gerar um trampolim para lançar novos avanços. Para isso, ela precisa avançar cerca de 100 km na direção sul a partir da antiga linha de frente, onde a Ucrânia barrou os avanços da Rússia em março de 2022, na direção do Mar de Azov.
As principais defesas russas ficam cerca de 70 km atrás de território fortemente defendido. Essas são as mais difíceis de atravessar.
A estratégia ucraniana tem sido de tentar penetrar, atacando em múltiplos pontos para encontrar um ponto fraco nas defesas. A Rússia, que vem se preparando para o contra-ataque há meses, procura desacelerar as tropas ucranianas com minas terrestres, artilharia e helicópteros.
O êxito da Kiev depende agora de quantos tanques, blindados e soldados ela conseguirá preservar antes de alcançar a linha defensiva russa numa batalha. Durante o inverno a Ucrânia e aliados ocidentais treinaram e equiparam cerca de 40 mil soldados para o ataque.
“Quanto de armamento eles ainda terão disponível quando esse momento chegar?”, perguntou Michael Kofman, diretor de estudos da Rússia no CNA, um instituto de pesquisas na Virgínia. “Muito do que estamos vendo até agora é inconclusivo.”
Em dois dos três pontos de ataque, ao sul das cidades de Velika Novosilka e de Zaporíjia, a Ucrânia pouco a pouco retomou oito vilarejos. No terceiro ponto, ao sul da cidade de Orikhiv, onde o blindado Bradley atingiu uma mina, o avanço parece ter travado.
Curiosamente, a Ucrânia avançou nos dois locais onde as tropas receberam menos armas ocidentais mais novas e atolou nos lugares onde estão sendo usadas as armas mais sofisticadas –blindados americanos Bradley e tanques alemães do tipo Leopard 2.
Não está claro se isso ocorre porque os equipamentos ocidentais foram enviados intencionalmente para áreas onde as defesas russas são consideradas mais robustas.
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